A Resiliência trata-se de um conjunto de processos sociais e intrapsíquicos que possibilitam o desenvolvimento de uma vida sadia, mesmo vivendo num ambiente não sadio. Não pode ser entendido como um atributo que nasce com o sujeito, nem que ele adquire durante o seu desenvolvimento. Resulta da combinação entre os atributos da criança ou jovem e o seu ambiente familiar, social e cultural.
Portanto, traduz a possibilidade de superação num sentido dialético, o que representa não uma eliminação, mas uma re-significação do problema. Assim, crianças resilientes respondem de modo consistente e positivo aos desafios e às dificuldades, além de reagirem com flexibilidade diante de circunstâncias desfavoráveis, através de uma atitude otimista e perseverante. Ainda assim, se as circunstâncias sofrem alterações, a resiliência altera-se, dando conta de que o constructo “resiliência” não é perdurável no tempo nem em todas as áreas vivenciais.
Para se compreender a resiliência, tem-se que ter em conta os fatores de risco e os fatores protetores.
Os fatores de risco são obstáculos individuais ou ambientais que aumentam a vulnerabilidade da criança para resultados negativos no seu desenvolvimento. São, por exemplo: pobreza, ruturas familiares, violência, doença no próprio indivíduo ou na família, perdas importantes, etc.
O acúmulo de fatores de risco produz a resiliência, uma vez que todo o ser humano possui um limite pra lidar com o stress. Celia e Souza (2002) comentam que ter mais do que quatro eventos stressantes na vida eleva a condição de risco. Ainda assim, não basta saber se o indivíduo vivenciou determinada situação, mas também como o evento o afetou emocionalmente. Deste modo, o acúmulo de stressores familiares potencia 33% da ocorrência de problemas psiquiátricos em crianças. Ou seja, é o conjunto de eventos ao longo do tempo que contribui para a resiliência ou, por outro lado, a vulnerabilidade psicológica.
Por vulnerabilidade entende-se a predisposição individual para desenvolver variadas formas de psicopatologias ou comportamentos não eficazes, ou suscetibilidade para um resultado negativo no desenvolvimento.
Por sua vez os fatores de proteção ou de modificação da resposta do indivíduo aos fatores de risco apresentam quatro funções:
(1) Reduzir o impacto dos riscos;
(2) Reduzir as reações negativas em cadeia que se seguem à exposição a situações de risco;
(3) Estabelecer e manter a autoestima e autoeficácia, através do estabelecimento de relações de apego seguras e o cumprimento de tarefas de sucesso;
(4) Criar oportunidades para reverter os efeitos de stress.
Existem três tipos de fatores de proteção para a criança/adolescente:
(1) Fatores individuais – autoestima positiva, autocontrolo, autonomia, temperamento afetuoso e flexível.
(2) Fatores familiares – coesão, estabilidade, respeito mútuo; apoio/suporte.
(3) Fatores relacionados com apoio do meio ambiente – bom relacionamento com amigos, professores ou pessoas significativas que assumem um papel de referência segura à criança e a faça sentir querida e amada.
O potencial de proteção deve ser avaliado de acordo com elementos internos e externos do desenvolvimento, considerando outros mecanismos de proteção, como: 1) constância e permanência no cuidado à criança; 2) habilidades para solução de problemas; 3) empatia no relacionamento com amigos e adultos; e 4) identificação com modelos adultos ou crianças mais velhas e mais competentes.
Quem fala em fatores de proteção, fala também em “coping”. Refere-se ao posicionamento e às ações individuais frente às situações negativas de vida. São esforços cognitivos e comportamentais utilizados pelo indivíduo para lidar com as situações indutoras de stress. Pode ser um esforço para regular o estado emocional associado ao stress, ou um esforço para agir na origem do stress, tentando modificá-lo.
As estratégias de coping mais voltadas para o enfrentamento direto dos problemas ou a elaboração das dificuldades são mais encontradas em indivíduos resilientes, moderando o efeito das adversidades.
Desta forma, diante dos fatores potencialmente geradores de desequilíbrio para cada indivíduo, os mecanismos de proteção são tomados como o ponto-chave necessário para o restabelecimento do equilíbrio perdido e demonstração de competência, apesar da adversidade.
Assim sendo, os adultos resilientes são descritos na Primeira Infância como pessoas muito afetuosas, ativas, de boa índole e fáceis de lidar. Quando adolescentes tendem a mostrar maior autoconceito, autocontrolo, facilidade em interagir com amigos, professores e inserir-se em grupos.
A salientar que a família é um fator protetor e um fator de risco na literatura. Esta aparente ambiguidade é justificada quando se considera a família como um grupo social básico do indivíduo, cuja função e estrutura são determinantes no seu desenvolvimento. As relações entre pais e filhos são caraterizadas por uma enorme complexidade sendo, então, indispensável a promoção, por parte dos pais ou cuidadores, de um ambiente incentivador, protetivo e seguro, onde a criança possa aprender e se desenvolver. A família protetiva proporciona o alicerce necessário para a sua socialização.
Por sua via, a proximidade com os irmãos propicia ainda o apoio emocional, estendendo-se na vida adulta em maior competência social e iniciativa no auxílio ao outro. Assim, o irmão mais velho que cuida dos mais novos desenvolve-se socialmente, revelando comportamento pró-social responsável, maior autonomia, melhores estratégias cognitivas, responsabilidade social e treinamento em funções que vai desempenhar ao longo do seu ciclo de vida.
Clara Conde