Os homens devem saber que do cérebro, e somente dele, vêm as alegrias, as delícias, o prazer, o riso e também, o sofrimento, a dor e os lamentos. É por ele que adquirimos sabedoria e conhecimento e vemos, e ouvimos e sabemos o que está bem e o que está mal, o que é doce e o que é amargo. E por esse mesmo órgão, nos tornamos loucos, deliramos e o medo e o terror nos assaltam. É o máximo poder no homem. É nosso intérprete daquelas coisas que estão no ar. Hipócrates
Estamos inscritos no mundo antes mesmo do nosso nascimento. Somos necessariamente concebidos a partir dos desejos e das palavras dos nossos pais. Eles imaginaram-nos e desejaram-nos rapariga ou rapaz, bonitos, ágeis, simpáticos; escolheram-nos um nome, o de um avô, de uma avó, banal ou mais original, o de um irmão ou irmã que morreram, em memória de uma pessoa que foi muito amada ou como homenagem a alguém que admiram ou respeitam.
Todos estes desejos, identificações e fantasias anteriores ao nascimento acabam por fazer parte da identidade do bebé, mas quando nasce, a sua personalidade e aparência próprias acabam por ajustar o bebé imaginado ao bebé real, que já tem o seu espaço próprio na família e no amor dos seus pais.
“Primeira infância” é o nome dado aos primeiros anos de vida, em particular, os cinco primeiros, de um ser humano, que são marcados por intensos processos de desenvolvimento. É uma fase determinante para a capacidade cognitiva e sociabilidade do indivíduo, pois o cérebro absorve todas as informações, as respostas são rápidas e duradouras. Segundo especialistas, as crianças nesta fase precisam de oportunidades e estímulos, para que possam desenvolver cada uma das suas aptidões.
Estudos demonstram que é durante a primeira infância que o cérebro humano desenvolve a maioria das ligações entre os neurónios. Até os 3 anos de idade, as cerca de 100 biliões de células cerebrais com as quais uma criança nasce desenvolvem 1 quadrilião de ligações. O número é o dobro de conexões que um adulto possui. Aos 4 anos, estima-se que a criança tenha atingido metade do seu potencial intelectual.
Isto é, a primeira infância é uma das mais importantes para o desenvolvimento humano e para que nos tornemos adultos funcionais, participativos e responsáveis. É nesta idade que, como tantos outros sistemas no corpo humano, o cérebro - centro de todo o processo de desenvolvimento e aprendizagem - se expande e consolida e está mais receptivo à estimulação e à experimentação.
Indiscutivelmente, a infância é uma etapa crucial no desenvolvimento vital do ser humano. Nela se consolida toda a base para as aprendizagens posteriores, já que o crescimento e desenvolvimento cerebral, resultantes da sinergia entre um código genético e as experiências de interacção com o ambiente, permitirão uma incomparável aprendizagem e o desenvolvimento de habilidades sociais, emocionais, cognitivas, sensopercetivas e motoras, que serão a base de toda uma vida. Nessa etapa, o cérebro experimenta mudanças fenomenais: cresce, desenvolve-se e passa por períodos sensíveis para algumas aprendizagens, e, por esta razão, necessita de um feedback com experiências significativas, estímulos multissensoriais, recursos físicos adequados; mas, principalmente, necessita de um ambiente intensificado pelo cuidado, pela responsabilidade e pelo afeto de um adulto comprometido.
Por outro lado, as investigações acerca do ambiente em que estão imersas as crianças têm demonstrado que a relação destas com os adultos com quem se relacionam causa um grande impacto no desenvolvimento do seu cérebro desde a etapa pré-natal. A alimentação, a exposição ou utilização de algumas substâncias químicas e o estado de ânimo da mãe durante a gestação, entre outros, são fatores de influência para um cérebro que está em plena formação. O cuidado do ambiente físico, as carícias, os diálogos, os jogos, o afeto e as canções, são outros elementos presentes na relação entre pais, educadores e crianças desde o nascimento.
O papel fundamental dos pais e educadores, neste processo, é o de cuidar, dar e promover um ambiente propício a que o processo natural de desenvolvimento ocorra positivamente, bem como, assumir a sua função e responsabilidade na contribuição externa neste mesmo processo.
Sendo assim, as relações interpessoais são o eixo central do desenvolvimento infantil, já que as crianças aprendem dos adultos as habilidades emocionais, sociais, cognitivas e, ademais, adaptam-se ao seu ambiente. Quanto maior for o conhecimento que o adulto tenha acerca do processo do desenvolvimento cerebral infantil, mais alta será a probabilidade de atuar favoravelmente na primeira infância.
Clara Conde